sexta-feira, 1 de março de 2019

Microcodes: O ponto fraco e forte do N64!

Posted by | março 01, 2019




Esse é um dos aspectos mais obscuros do N64 e poucas pessoas têm conhecimento disso, embora isso, os microcodes são extremamente essenciais para o sistema e estão relacionados diretamente com a qualidade dos games, como vocês perceberão a seguir.

Antes de começar, caso você não tenha conhecimento do hardware do N64 e de como ele funciona, sugiro que leia antes os outros posts que tem aqui no blog que explicam um pouco sobre as estranhas do N64, esse conhecimento será útil para o que veremos hoje. Não se preocupe que não entrarem em detalhes em aspectos técnicos. Esse post só complementará o que já foi abordado nos outros posts.

Segue os links dos posts sobre o Hardware do N64:

Agora vamos aos Microcodes


Desenvolver para o N64 não era a melhor coisa do mundo, é muito fácil ver comentários ou depoimentos de alguns desenvolvedores falando como era difícil criar um game para o sistema, sendo o obstáculo que o mais conhecido, a mídia do N64: o cartucho. Por ser uma mídia que tem pouca capacidade de armazenamento de dados, não era possível criar games gigantescos, com cutscenes, trilhas sonoras de alta qualidade (não que o N64 não fosse capaz de reproduzir músicas com qualidade de CD, a capacidade do cartucho e o processamento do N64 que impediam de se aproveitar o máximo do som) e etc.

Se o N64 está associado ao “borrão”, é por causa de sua limitação, os desenvolvedores só podiam usar texturas com 4KB de tamanho, o que eles faziam era pegar a imagem pequena e depois esticá-la o máximo possível, depois borrar ela para esconder o pixelado e o resultado disso já conhecemos, um anti-alisiang que pode mais atrapalhar do que ajudar (sobre assunto abordado em outro posts do blog).

De qualquer forma, algo bem interessante quanto ao hardware do N64 é que o RCP (Reality Co-Processor ou GPU) e o audio co-processor são programáveis através de microcode.

Microcode é uma técnica de escrever um código que fará a ponte entre o software e o hardware, no caso do N64 o Microcode é usado para dar instruções a RCP para que ela faça determinadas ações e tarefas, esse processo envolve outros dois componentes do N64, o Reality Signal Processor (RSP) e the Reality Display Processor (RDP). Com o Microcode é possível explorar mais a potência do hardware, para que ele faça mais efeitos e tenha mais polígonos.

 (Um esquema que mostra como funciona o N64, veja que o coração do console é o RCP, as setas indicação a via das informações)

O Microcode padrão do N64 foi desenvolvido pela SGI e Nintendo, o problema era que esse Microcode era muito básico, difícil de lidar e com uma documentação muito pobre (quase inexistente). Isso acabou afetando vários games, que acabaram tendo uma qualidade duvidosa e com vários bugs e glitches.

Sem querer entrar nesse assunto muito detalhadamente, existiu vários tipos de Microcode, o padrão do sistema é o Fast3D, que permite de 100.000 polígonos, sendo ele mais preciso do que rápido, o que a Nintendo usava era o Turbo3D que permitia ter 500.000 – 600.000 polígonos, todavia a Nintendo não recomendava o uso desse último pelo fato que o gráfico não ficava bom. Por exemplo, o modelo do Mario no game Super Mario 64 é composto por 700 polígonos.

Vamos ao exemplos!


 (Daqui para frente deixará de ser técnico e será mais tranquilo, eu prometo!)
Apesar disso, os estúdios poderiam muito bem criar o seu próprio Microcode caso quisessem. Foi o que a Rare fez! Como muitos devem saber o Donkey Kong 64 só precisa do Expansion Pak para evitar um bug, exceto por isso, não seria realmente necessário (O Donkey Kong 64 não está nem em alta-resolução, somente o logo da Rare no início do game está em 480p), agora Conker Bad Fur Day é um game impressionante, tecnicamente falando, tem gráficos bonitos, tem dublagem e cutscenes usando gráficos em tempo real, isso levanta a pergunta, como é que esse game é bom bonito e não precisa de Expansion Pak. Bem, parte da resposta está no Microcode que a Rare criou (muitas das melhorias do Conker se devem ao fato que a Rare teve tempo para trabalhar esse título, anos para ser mais exato, internamente a Rare era dividida em diversos grupos de pessoas que trabalhavam em projetos diferentes).

Não só a Rare fez isso, a Factor 5 fez algo ainda mais impressionante!

O port do game Indiana Jones do Pc para N64 foi trabalhoso, mas valeu a pena! O objetivo deles era ter o game em alta resolução e com gráficos bonitos, eles conseguiram colocar tudo que tinha na versão de Pc e um pouco mais, a versão de N64 tem músicas extras, eles criaram uma engine de luz e sombria em tempo real, câmera melhorada. A Factor 5 usou o cartucho quase como uma memória RAM adicional, então as fases são transmitidas, o que deixa tudo mais rápido. Além disso, eles conseguiram burlar a limitação de 4KB das texturas. Resumindo, o game do Indiana Jones: The Infernal Machine é um exemplo de como um bom time de desenvolvimento e um bom Microcode customizado conseguem realizar (e eles transformaram o cartucho em um ponto a favor).


E não paramos aqui! Ainda temos o Star Wars Rogue Squadron e Battle for Naboo. Com o Microcode customizado, foi possível criar uma paisagem em alta resolução para o Rogue Squadron, que é o segundo game a se beneficiar do uso do Expansion Pak (o primeiro é o Turok 2: Seed of Evil). Já com o Battle for Naboo, a Factor usou o que aprendeu com o Rogue Squadron, mas preferiram começar do zero com um novo Microcode, o objetivo deles era ter um game que rodasse em alta resolução, com paisagens bonitas (efeitos de clima incluso) e com um framerate constante, com isso Battle for Naboo tem um draw distance maior que o seu predecessor, com chuva e neve que podem ter 3.000 partículas sem prejudicar o framerate.


Outro caso de Microcode customizado é o game World Driver Championship do estúdio Boss Game Studio, uma desenvolvedora especializada em games de corrida para o N64. Com o uso do Microcode, a BGS conseguiu no WDC: modelos de alta contagem de polígonos, um draw distance grande, texturas de alta qualidade, efeito Doppler com áudio MP3 (N64 tem suporte a diversos formatos de áudio) e efeito realista de tempo. E a cereja do bolo é que o game tem suporte à alta resolução sem o uso do Expansion Pak! Isso sem comprometer o framerate do game!!! Isso é algo que muito games não conseguiam fazer mesmo com o Expansion Pak!


Muitos já devem ter notado o padrão: Indiana Jones The Infernal Machine, Star Wars Rogue Squadron, Battle for Naboo e World Driver Championship são games que tem problemas para serem emulados. Isso é por causa justamente do Microcode. Eu deixarei aqui a lista de compatibilidade atual do Project (http://pj64wiki.com/index.php?title=N64_Official_Game_List), atualmente eles até funcionam melhor!

Até a Trevas tem o seu charme?


Talvez, também podemos incluir nesse panteão a Silicon Knights, onde, originalmente, estava desenvolvendo o Eternal Darkness para o N64, nunca saberemos como esse game ficaria no N64 depois de pronto, porém, através de relatos da época,  como da IGN (clique aqui) e do próprio desenvolvedor, Denis Dyack, o Eternal Darkness não precisava de Expansion Pak para ter alta resolução, quando eles mostraram esse game para a Nintendo, eles não acreditaram nesse feito e até abriram a porta de expansão para constatar que realmente só estava o Jumper Pak. Além disso, o Eternal Darkness era totalmente 3D, diferente do Resident Evil e contava com 30fps constantes. Porém, não podemos confirmar como a Silicon Knight conseguiu tal feito no N64, se foi através de muita compressão e chips especiais ou se realmente estava usando um Microcode excelente!

Mesmo sem ser lançado oficialmente, Eternal Darkness deve ser um dos feitos, se não o mais impressionantes da biblioteca do N64!




E o que aprendemos aqui?


A arquitetura do N64 não foi uma das mais bem desenvolvidas, mesmo que o N64 tenha sido divulgado como um console de 64-bits, seu funcionamento era na verdade em 32-bits (não estamos falando de gráficos, sim de processamento, ou melhor ainda, BUS da memória), tudo isso criava uma latência grande no console, o espaço de armazenamento do cartucho só piorava ainda mais a situação!

Jogue o microcode mal feito e documentado, temos uma receita para o desastre! Não é a toa que muitas Thirds sofreram para desenvolver para o N64 (não joguem toda culpa no cartucho).

Ainda sim, como tudo na vida, sempre existe um jeito! E se o estúdio soubesse trabalhar, conseguiria ‘tirar leite de pedra’ no N64, principalmente se ele fizesse o seu próprio microcode. Temos bons exemplos que mostram que o N64 tinha potencial muito grande, games como a série Star Wars da Factor 5, alguns games da Rare e WDC da Boss Games mostram que era sim possível extrapolar o limite do N64 (Factor 5 era tão habilidosa que foi ela que fez a compressão do áudio no Pokémon Stadium, veja na tela título).




Sendo assim, podemos perceber que uma parcela da ‘culpa’ na qualidade dos games do N64 se deve justamente ao próprio N64 em si! Ainda sim, o N64 não se compara ao desenvolvimento de games para o Saturn (que é ainda pior para se desenvolver! O que não estou dizendo que o Saturn é pior que o N64 em games!).

Se a Nintendo e SGI tivessem feito o N64 bom uma melhor organização dos componentes internos (o N64 sofreu adiantamentos no seu lançamento) e tivesse desenvolvido um Microcode padrão melhor, a história poderia ser muito bem diferente e hoje o N64 poderia ter uma biblioteca de games mais vasta e com uma qualidade ainda maior. Sinceramente, as vezes, até parece que a Nintendo não aprendeu a lição (Sim! Estou me referindo ao Wii e Wii U).

Espero que tenham gostado de mais um artigo sobre o hardware do N64 e de como ele funciona! Deixem o seu comentário e até a próxima!

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Comentários ( 20 )

  1. Leonardo Mota escreveu:
    30 de agosto de 2017 às 05:45
     

    Muito foda esse artigo, parabéns...

  2. Tassio Bruno Silva escreveu:
    30 de agosto de 2017 às 08:49
     

    Tô sempre de olho Marlon meu velho!

  3. José Marlon Oliveira escreveu:
    30 de agosto de 2017 às 10:33
     

    A quanto tempo, grande Tássio?!
    É uma honra ver você novamente por essas bandas!!

  4. Alexandre Viana escreveu:
    30 de agosto de 2017 às 14:28
     

    Uma grande parte dos games que tem alta resolução sofrem com o framerate baixo, infelizmente isso acontece com o Star Wars Rogue Squadron, eu até diria que isso não deve ofuscar o game (se não estou enganado o StarFox de Snes roda a 15fps ou 20 no máximo). Sim, o trabalho de compressão de áudio da Factor 5 é impressionante mesmo!


    Indiana Jones é aquela coisa, ele tem coisa boa mas infelizmente tem muitas coisas ruim. Eu não quero me focar nos pontos negativos desses games, principalmente por esse texto só ser sobre o Microcodes e do que era possível de fazer com ele.

    Em questão técnica eu fico mais impressionado com o F-Zero X, o que eles tiveram que fazer para manter a taxa de 60fps. Também gostaria muito que um beta do Eternal Darkness fosse liberado na net para podemos ver como é.

  5. Alexandre Viana escreveu:
    30 de agosto de 2017 às 14:28
     

    Sim, esse é o objetivo.

    Quem sabe nós não fazemos um livro? Quanto mais informação desse tipo, melhor!

  6. Rubens Vilela escreveu:
    30 de agosto de 2017 às 14:45
     

    Digo o mesmo. É bom te ver aqui.

  7. Tassio Bruno Silva escreveu:
    2 de setembro de 2017 às 19:25
     

    Fala Rubens! Só gente das antiga! kkk Tamo junto!

  8. Tassio Bruno Silva escreveu:
    23 de setembro de 2017 às 14:23
     

    Excelente artigo!

  9. Ulisses 8 Bits escreveu:
    23 de setembro de 2017 às 14:23
     

    O 64 é sensacional mas eu sinto uma diferença mais forte graficamente falando quando um jogo é da casa e quando não é. Essa coisa dos microcodes desvendam muito sobre essas diferenças. Para nós que observamos de fora e não é programador, a impressão que dá é que as terceirizadas simplesmente não se empenhavam tanto e por isso jogos mais simples. Mas agora fica mais claro que estas coisas de programação complexa e kits "verdes" para a comunidade de DEV´s, influenciou muito na biblioteca do 64. Eu adorei saber que nem tudo é culpa dos cartuchos. ^_^
    Ótimo post Alexandre!

  10. Thiago Ribeiro escreveu:
    23 de setembro de 2017 às 14:23
     

    Esse protecionismo exagerado da Nintendo teve muitos efeitos colaterais. Artigo sensacional, informação bacana e trazida de uma forma bem didática. Parabéns pessoal, vida longa ao site!

  11. Alexandre Viana escreveu:
    23 de setembro de 2017 às 14:23
     

    Obrigado, Diego!

    Pelo que eu sei, a Nintendo era meio chata quanto a liberação do kit de desenvolvimento, imagina quanto ao microcode, além disso o N64 é uma co-produção com a Silicon Graphics, então isso dependia também da outra empresa. Como a Nintendo lidava muito bem com o N64, ela não se importava muito com os problemas que as Thirds tinham! Na verdade isso só mudou recentemente com o Switch shuahush agora ele decidiu usar uma arquitetura que é mais amigável para as Thirds, possibilitando que ela possam fazer ports com mais facilidade!

  12. Alex Vasco escreveu:
    23 de setembro de 2017 às 14:23
     

    Mas vale lembra q em WDC o modo alta resolução é em letterbox, cortando metade do cenário pra manter o frame-rate. N deixa de ser um feito, mas todos os jogos q usam expansion pack pra alta resolução tem quedas bruscas no frame rate (ISS 2000 por exemplo é injogável)

  13. Mardones escreveu:
    23 de setembro de 2017 às 14:23
     

    Muito bom seu texto, parabéns! Ouvi falar em microcodes pela primeira vez quando conheci WDC, e finalmente um artigo em português para explicar oque é. Muito obrigado.

  14. Diego Peres escreveu:
    23 de setembro de 2017 às 14:23
     

    Uou, excelente artigo.
    Uma pergunta que me passou pela cabeça é o porque de a Nintendo não adquirir um microcode bem feito de alguma que o personalizara e disponibilizar para as demais desenvolvedoras, mesmo que pra isso precisasse pagar? Acredito que isso faria a qualidade geral dos jogos subir bastante.
    Deu até vontade de ligar meu N64 e jogar os bons e velhos jogos em cartucho rsrs

  15. Alexandre Viana escreveu:
    23 de setembro de 2017 às 14:23
     

    Valeu, Leonardo!

    Você fez o vídeo sobre o Conker?
    Eu gostaria muito de ver mas não sei qual é o seu canal!

  16. Alexandre Viana escreveu:
    23 de setembro de 2017 às 14:23
     

    Um dia eu farei um Off Topic, ou artigo ou um podcast justamente sobre o Expansion Pak! Pois, se fomos levar em conta os games que REALMENTE precisam do Expansion Pak, estamos falando de 5 ou 6 games (7 no máximo), de resto o Expansion Pak não é necessário! No final ele se torna um acessório opcional!

  17. Refele escreveu:
    27 de dezembro de 2017 às 11:56
     

    Só um detalhe, quem ainda tem os planfletos promocionais e as caixas da Gradiente, deem uma olhada pois alguns possuem imagens do Eternal Darkness que provavelmente nao estao na internet. Percebi em uma das Nintendo World tambem que há uma imagem de Castlevania 64 (beta) que é impossivel achar via google.

  18. Alexandre Viana escreveu:
    9 de janeiro de 2018 às 21:08
     

    Sério?

    Tem como você nos enviar essas fotos? Seria muito legal ter elas para preservação histórica.

  19. Refele escreveu:
    19 de janeiro de 2018 às 09:52
     

    Vou dar uma vaculhada aqui, da um guento ai.

  20. Alexandre Viana escreveu:
    12 de junho de 2018 às 15:22
     

    Encontrou as imagens?

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